08/08/2013

Sete em cada oito menores de idade abrigados no Brasil têm família

"Os números mostram que toda a rede - tanto o judiciário como a assistência social - não está trabalhando de maneira adequada”, afirma a presidente da Comissão da Infância e Juventude do CNMP


Quem são e para onde vão os 45 mil adolescentes e crianças abrigados no Brasil? Um mapeamento do Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP), feito com base na inspeção de 86% das entidades que abrigam esses menores de 18 anos, traça um retrato preocupante: a maioria tem família. Apesar disso, 77% não receberam visita dos pais nos últimos dois meses e um terço está abrigado há mais de dois anos, limite máximo estabelecido pela lei.
 
"Os números mostram que toda a rede - tanto o judiciário como a assistência social - não está trabalhando de maneira adequada”, afirma Taís Schilling Ferraz, presidente da Comissão da Infância e Juventude do CNMP. “O correto é que, no prazo máximo de dois anos, fosse realizada a reinserção na família biológica ou, nos casos em que isso não é possível, a ação de destituição de poder e encaminhamento para adoção.”

Não é o que acontece. Hoje, apesar de a maioria dos abrigados não receber frequentemente a visita dos pais, o que fragiliza ainda mais o vínculo com a família, continuam atrelados a ela. Dados da Corregedoria Nacional de Justiça mostram que, dos mais de 45,6 mil abrigados em junho, menos de 6 mil estavam aptos à adoção, o que significa 1 em cada 8. Os outros 39 mil ainda esperam pela chamada reinserção familiar.
 
Uma mudança de perfil que explica até a troca de nomenclatura: nos “orfanatos” de antigamente, viviam os órfãos. Hoje, os abrigos dão guarida a vítimas de situação variadas. Para esses, a reinserção na família de origem é prioridade. A adoção, conforme prevê a lei, “é medida excepcional e só deve ocorrer quando esgotados os recursos de manutenção da criança ou adolescente na família”.
Por isso, assim que uma criança com esse perfil chega a um abrigo, a Justiça inicia um processo periódico de avaliação da situação dos pais - para saber se eles têm condições de reaver a guarda - e de busca pela família extensa, que são os tios ou avós que poderiam assumir a criação desses menores. “95% das crianças querem voltar para casa, mesmo aquela que apanha. Ela só não quer se a violência que sofreu foi muito grande”, explica a psicóloga Claudia Vidigal, presidente do Instituto Fazendo História, que atua com crianças e adolescentes abrigadas.

Reencontro

Em muitos casos dá certo, como aconteceu com os irmãos Melissa, de 11 anos, e Wellington, de 8. Durante os anos em que ficaram abrigados - após terem sido violentados pelo pai alcoólatra, com quem moravam desde que a mãe os havia abandonado -, eles pediam por uma tia avó que morava em uma casa com uma escada no fundo. Era só isso que sabiam dizer. Após três anos, a Justiça encontrou dona Maria Estela dos Santos, de 52 anos, que vivia na cidade ao lado.
 
Uma das ferramentas para reduzir o tempo de acolhimento são as audiências concentradas. Nelas, juiz, promotor de Justiça, defensor público e equipe técnica do serviço de acolhimento se reúnem dentro da unidade. Juntos, reavaliam a situação de cada criança com o objetivo de garantir que a criança ou o adolescente retorne com brevidade ao convívio com a sua família de origem, natural ou extensa, ou seja encaminhado para adoção.
 
Publicado em 08/08/2013 - Gazeta do Povo:

02/08/2013

Cuidando de crianças e adolescentes em vulnerabilidade social

A educação predominante tem sua atenção direcionada à transmissão dos conteúdos curriculares e ocupa-se pouco em conhecer o contexto e intervir na vida que seus alunos levam. Diante dessa abordagem, como ficam as crianças e os adolescentes em situação de vulnerabilidade social? Será possível para eles aprender na escola enquanto seu mundo desmorona?
 
Problemas pessoais significativos dificultam o aprendizado. Você já tentou estudar com algum tipo de dor? Imagine como é para um aluno que está com fome, com frio ou com piolhos… Você já tentou estudar quando estava abalado emocionalmente? Imagine como é difícil aprender para os milhões de crianças que vivem em lares desestruturados em que suas necessidades básicas, emocionais e físicas, são negligenciadas. Pense na dificuldade em aprender conteúdos curriculares de uma criança que sofre agressões físicas, sexuais, ou que é psicologicamente violentada. É compreensível se eles, talvez os que mais precisam da escola, forem os que menos aprendem.
 
Nossas escolas não têm estrutura para lidarem com os problemas sociais que nelas ecoam e é muito difícil para um professor intervir de maneira eficaz dispondo dos recursos que tem. Assim como é quase impossível para ele conhecer verdadeiramente seus alunos, considerando que atua com diversas turmas que totalizam centenas de jovens e crianças. Quanto à direção escolar e à equipe pedagógica, a situação é semelhante. Além disso, esses profissionais são desvalorizados pela sociedade e não tem em suas formações o preparo necessário para atuações com esse nível de profundidade. Aqueles que se importam realmente com esses alunos apenas sofrem junto.
 
Diante desse contexto, presente na maioria das escolas públicas do país, é necessário um novo olhar e a adoção de estratégias que realmente amparem e protejam a criança e o adolescente em situação de risco. Precisamos de equipes multidisciplinares dentro das escolas, com bons terapeutas, assistentes sociais especializados, instituições parceiras e de trabalhos que envolvam as famílias e as auxiliem na árdua tarefa de educar.

Artigo publicado em 01/08/2013 pela Gazeta do Povo:
http://www.gazetadopovo.com.br/blogs/educacao-e-midia/cuidando-de-criancas-e-adolescentes-em-vulnerabilidade-social/