A lista de crianças à espera de uma família é formada principalmente por negras
e maiores de 2 anos, características que não interessam à maioria dos casais
pretendentes
Na teoria, faltariam crianças para serem adotadas em todo o país. O Brasil tem
cinco vezes mais casais que desejam ser pais adotivos do que crianças aptas a
serem encaminhadas a essas famílias. Mas na prática a história é outra. Grande
parte dos pretendentes prefere crianças brancas e 54% desejam crianças de até 2
anos de idade. Na contramão dessa vontade, 66% dos meninos e das meninas que
esperam ser adotados são negros ou pardos e só 2,5% têm até 2 anos.
O país conta com 29.164 pretendentes a adotar inscritos no Cadastro Nacional
de Adoção (CNA), do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), enquanto 5.465 crianças
ou adolescentes estão à espera de uma nova família. No Paraná, a proporção é
semelhante. São 3.755 pretendentes e um total de 640 crianças.
Segundo o coordenador do Centro de Apoio Operacional das Promotorias de
Justiça de Proteção aos Direitos Humanos, Olympio de Sá Sotto Maior Neto, os
pais fazem restrições quanto à idade porque a maioria das crianças mais velhas
trazem lembranças da família biológica e do tempo em que ficaram em unidades de
acolhimento.
Em todo o país, a proporção de pretendentes que preferem crianças com 2 anos
é de 20%. Já para crianças com 10 anos, por exemplo, o índice cai para 0,65%
(veja infográfico). Olympio de Sá Sotto Maior Neto, um dos relatores do Estatuto
da Criança e do Adolescente (ECA), afirma que não raras vezes os casais
descrevem, inclusive, qual deve ser o biotipo dos futuros filhos.
Irmãos
O quadro se torna ainda mais grave quando se considera o número de pessoas
que aceitam adotar irmãos: apenas 19%, contra 81% que não aceitam. Além disso,
apenas 17,5% adotariam duas crianças e menos de 0,8% aceitariam três crianças.
“O ideal é sempre manter o grupo de irmãos”, ressalta Neto. Segundo o CNA,
somente 23% das crianças disponíveis para adoção não têm irmãos.
O desembargador Lauro Melo, do Tribunal de Justiça do Paraná, confirma que a
maioria das crianças aptas à adoção não corresponde ao perfil requerido pelos
pais brasileiros. “Após muito trabalho, um dia mudaremos esse cenário,
conseguindo a adoção de crianças maiores pelos nossos pretendentes . Mas para
isso é necessário investir em treinamentos e cursos de capacitação para pais
adotivos, o que vem ocorrendo no Paraná desde 2001, quando foram criados cursos
com o acompanhamento do Poder Judiciário”, declara.
Para Eliana Salcedo, presidente da ONG Recriar, entidade que auxilia pessoas
interessadas em adotar, não é a burocracia que deixa tantos candidatos
aguardando a adoção. “Nem sempre há o perfil da criança que os pais desejam. A
gente trabalha para que as pessoas amadureçam, mas muitas sonham em passar pela
maternidade e paternidade enquanto as crianças ainda são bebês”, salienta.
Adoção deve ser sempre a última opção
O coordenador do Centro de Apoio Operacional das Promotorias de Justiça de
Proteção aos Direitos Humanos, Olympio de Sá Sotto Maior Neto, ressalta que
colocar uma criança para adoção deve ser sempre uma exceção. A regra é esgotar
todas as fórmulas possíveis para mantê-la no seio familiar.
O Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), de 1990, determina que as
crianças têm o direito de serem criadas na família de origem. “A carência
material não pode ser motivo único para a destituição do poder familiar, como
ocorria antes”, salienta o procurador.
Em casos de abandono e violência física ou sexual, os pais podem ter a guarda
suspensa de forma temporária e a criança é encaminhada a um abrigo. “Temos a
perspectiva de superar as anomalias na relação familiar. Caso não seja possível
com os pais, a preferência é para que a criança seja criada por outros membros
da família”, afirma.
Casal derrubou empecilho da idade e adotou casal de irmãos
nordestinos
Quando os irmãos Mariana e Mariano estavam sendo levados para o Lar Maná, na
zona rural de Olinda (Pernambuco), em novembro de 2010, o casal Luiz Antônio, 51
anos, e Sílvia, 38, começou a frequentar cursos em Curitiba para interessados em
adotar. As crianças, abandonadas pela mãe, moraram no abrigo até julho de 2012,
quando o destino os uniu ao casal de advogados.
Até então, a vontade era adotar uma criança com menos de 2 anos, como a
maioria sonha. “Fomos amadurecendo a ideia e ao longo de uma entrevista optamos
por adotar crianças de 2 a 7 anos, que poderiam ser negras ou brancas e também
irmãs”, afirma. Enquanto isso, os funcionários do Lar Maná se esforçavam para
achar pretendentes que aceitassem Mariano e Mariana, de 6 e 5 anos,
respectivamente, e pele negra.
Após realizarem os cursos, Luiz e Sílvia entraram para o Cadastro Nacional em
janeiro de 2012. Depois de alguns meses sem retorno algum do Poder Judiciário do
Paraná, ele recebeu uma ligação surpreendente de Olinda. “A moça me contou a
história das crianças. Conversei com minha esposa e depois de refletir por um
bom tempo decidimos que em julho iríamos para lá”, diz. A partir daí já
começaram a trocar e-mails, enviando fotos e mensagens a Mariana e Mariano.
Ao chegarem a Olinda, saindo de um frio de quase 3ºC da capital paranaense
para uma cidade onde a temperatura beirava os 30ºC, foram conhecer os futuros
filhos. “Eles já estavam nos chamando de pai e mãe. Parecia que nos conhecíamos
de longa data. Conseguimos a guarda provisória e a adoção foi concretizada em
janeiro deste ano.” (DA)
Veja quais são os passos e pré-requisitos para quem deseja adotar:
- Qualquer adulto maior de 18 anos pode se tornar pai adotivo, desde que seja pelo menos 16 anos mais velho do que o adotando e procure a Vara de Infância e Juventude do seu município.
- O curso de preparação psicossocial e jurídica para adoção é obrigatório. A partir do laudo da equipe técnica da Vara e do parecer emitido pelo Ministério Público, o juiz decide se a pessoa pode participar do Cadastro Nacional.
- A partir daí deve-se aguardar até aparecer uma criança com perfil compatível com o fixado pelo pretendente durante a entrevista técnica.
Fonte: CNJ
Fonte: Gazeta do Povo
Publicado em 11/04/2013
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